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A Douta Ignorância

Política, Economia, Literatura, Ciência, Actualidade

A Douta Ignorância

Política, Economia, Literatura, Ciência, Actualidade

Lamúria e acção

Tiago Moreira Ramalho, 28.10.10

No outro dia, sem espírito para leituras longas e desatentas, fui à estante e peguei numa colecção de crónicas de António Barreto. A última de todas, creio – Anos Difíceis. António Barreto escreve sempre bem, em todos os sentidos, o que permite um elevado grau de certeza quanto à bondade da aposta. No caso, indo ao índice, onde não me consigo guiar, que os títulos são cada vez menos bons, que os editores acham sempre que percebem do que não percebem, acabei a ler as considerações de Barreto sobre a mentira na política. Poderíamos esperar a banalidade. Ai, os políticos, malandros, mentirosos, dizem isto, depois dizem aquilo, ai. Não. Era um texto sólido que, mais do que criticar os políticos, criticava uma sociedade, a nossa, que lhes permite tais luxos. Criticava uma democracia cujo Parlamento é uma inutilidade dispendiosa, em que liberdade de imprensa não é usada para escrutinar a acção do governo, em que o eleitorado nunca usa o voto para punir maus comportamentos. O ponto é precisamente este. A ocasião cria o ladrão e por muito que o povo, o eterno descontente, esbraceje, a verdade é que se houvesse consciência do que significa ter o poder na sua mão, a lamúria daria lugar a acção.