Cadeiras
Com uma regularidade mais ou menos trimestral a nação decide discutir o número de deputados. É daquelas obsessões que todos os povos têm. Podia dar-nos para pior.
O argumento utilizado é sempre o mesmo, o da crise. Como estamos em crise, temos de reduzir gastos e podemos começar por reduzir os gastos com os deputados. Preclaros leitores, as despesas da democracia são as últimas a poderem ser reduzidas. Se a democracia funciona melhor com 230 deputados, pois que se despeçam gestores, que se fechem institutos, que se faça o pino na Rua Garrett em troca de moedinha, mas nada de cortar na alimentação do Estado.
A grande questão é que, apesar de servir de argumento, a crise não é a real motivação. Interessa pouco, sejamos objectivos, o impacto orçamental de mais ou menos umas dezenas de deputados. É uma autêntica gota de água. A questão é estritamente política, numa lógica de obtenção de poder e influência. Com o sistema eleitoral que é o nosso, um Parlamento menor significa um Parlamento tendencialmente mais bipolar, com menor representação dos partidos pequenos e, obviamente, uma quase garantida maioria absoluta «solitária» de um dos maiores partidos. É o atalho para o poder, atalho que não deve ser criado a bem de uma boa representatividade. Se já hoje os resultados eleitorais não são evidentes pela composição do Parlamento, com uma redução do número de deputados, a diferença seria colossal. E se já temos dificuldade bastante em identificarmo-nos com o Parlamento, pensemos no que seria caso uma larga, larguíssima parte da população se visse fora da decisão política.