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A Douta Ignorância

Política, Economia, Literatura, Ciência, Actualidade

A Douta Ignorância

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Não são anjos

Rui Passos Rocha, 07.04.10

Na tradição bíblica, a ordem humana não resultou da evolução - querida aos filósofos não escolásticos - de um estado de coisas natural para um social, mas de um estado de coisas puro para um corrupto. Não há como escapar à tragédia: a da queda original, de Adão e Eva, e a da queda comunal, da crucificação de Jesus. Quem olha, como a maioria, para a História como uma sucessão de avanços (mais ou menos planeados e ponderados, antecedidos ou não de recuos) e como um processo de aprendizagem acumulada não pode ser um verdadeiro católico ou, sobretudo, protestante - no sentido de ter assimilado e adoptado a teologia como manual de instruções para a sua vida. Pode, quanto muito, ser um cristão, crente na superioridade moral e na divindade de Jesus, mas que ao mesmo tempo rejeita a literalidade da Bíblia e dois milénios de interpretações escolásticas do significado das acções de Cristo. É o crescente número desses cristãos, que absolutizam a mensagem de bondade bíblica e se envergonham com as deturpações na interpretação religiosa, que forçará mudanças no Vaticano. A ideia da queda como legitimação dos "desvios" dos padres - que afinal "não são anjos" e sofrem as consequências de estarem inseridos numa sociedade originalmente amoral - está a esvaziar-se de sentido.