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A Douta Ignorância

Política, Economia, Literatura, Ciência, Actualidade

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Mitos

Priscila Rêgo, 15.11.11

O Carlos Guimarães Pinto elencou oito mitos acerca da crise financeira. Desfez alguns mas, provavelmente porque a coisa assim não dava luta, aproveitou para acrescentar à lista alguns das sua safra. O primeiro é o do BCE.

 

Mito: Os bancos orquestaram a crise para poderem emprestar dinheiro a juros altos enquanto obtêm financiamento do BCE a 1%
Realidade: Os empréstimos do BCE aos bancos são por um dia, renováveis e mediante colateral. Os empréstimos dos bancos ao estado são feitos por prazos prolongados (1, 2, 5 e 10 anos) e sem colateral, pelo que o risco é muito superior.

 

Na verdade, desde há algum tempo que o BCE empresta efectivamente a mais do que um dia à banca europeia. O próprio BCE faz um apanhado catita destas operações no seu boletim trimestral (que está acessível ao público). Há empréstimos a um dia, a nove dias, a um mês, a três meses e até a uns exóticos 12 meses inteirinhos.

 

Claro que empréstimos a um ano não são obrigações a 10 anos. Mas numa altura em que Estados como Portugal chegavam a pagar mais de 4% por bilhetes do Tesouro (menos de 12 meses), parece-me que são legítimas algumas críticas de arbitragem indevida à banca. Pelo menos durante algum tempo, os bancos europeus conseguiram mesmo fazer o jogo da multiplicação dos pães.

 

Ver a banca como "predadora" dos países periféricos pode ser enganador: como o Carlos diz, quem arriscou usar a liquidez do BCE para apostar na dívida grega não deve ter achado piada ao resultado da brincadeira. A crítica pode contudo fazer sentido no caso de países cuja situação financeira só se tornou problemática quando os juros se tornaram insustentáveis. A Itália, que tem um saldo primário positivo parece ser uma boa candidata.

 

Mito: A crise da dívida só se resolve se os estados lançarem políticas expansionistas que façam crescer a economia
Realidade: Foram as políticas expansionistas e os défices constantes que trouxeram países como a Grécia e Portugal à actual situação. Se políticas Keynesianas de expansão do investimento e défice das contas públicas funcionassem, nem a Grécia, nem Portugal estariam na actual situação. Ambos os países apresentarem défices públicos de forma permanente nos últimos 10 anos e nem por isso cresceram mais que os seus pares que mantiveram contas equilibradas (...)

Há aqui duas ideias diferentes. A primeira é a questão da culpa. Sem entrar em moralismos, a Irlanda e Espanha eram dos poucos países europeus que tinham excedentes orçamentais em 2006. É difícil olhar para a forma como Portugal foi governado e para o sistema estatístico grego e concluir que as contas públicas não têm nada a ver com o que se está a passar - mas os casos irlandês e espanhol sugerem que não foi só irresponsabilidade orçamental. Até porque, em termos de défices e keynesianismo, a periferia esteve em muito boa companhia durante a última década (lembram-se de quem foi o primeiro país a romper o Pacto de Estabilidade?).

 

A segunda é a do crescimento. O Carlos diz que "nem por isso" Portugal e Grécia "cresceram mais que os seus pares que mantiveram contas equilibradas". Mas isto só é válido para Portugal; porque a Grécia cresceu mesmo mais - na verdade, muito mais - do que a média europeia. Parece que o "acelerador" keynesiano funciona mesmo, embora a Grécia o tenha usado durante demasiado tempo. Com o desemprego nos níveis em que está e com a recessão à porta, talvez seja cedo para dizer que não teremos de recorrer de novo ao expediente.

 

 

 

 

2 comentários

  • Sem imagem de perfil

    PR 15.11.2011

    Também pensei meter isso, mas deixei de fora porque o próprio CGP não é muito peremptório nesse ponto. O que estranhei mais foi o valor do défice [pensava que tivesse sido substancialmente maior], mas confirmei na FRED que o valor está correcto.
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