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A Douta Ignorância

Política, Economia, Literatura, Ciência, Actualidade

A Douta Ignorância

Política, Economia, Literatura, Ciência, Actualidade

Cinema Lusitano

Bruno Vieira Amaral, 31.03.10

“Portugal é o único país do mundo onde não é grave um filme apoiado pelo Estado fazer dois espectadores", afirma o realizador António Ferreira, em declarações ao Público. O Estado financia e em troca exige nada. Aquele Querido Mês de Agosto, do realizador Miguel Gomes, recebeu um subsídio de 650 mil euros, fez 20.164 espectadores e uma receita bruta de 90 mil euros. Foi considerado um êxito. Se isto é um sucesso, imagine-se o resto. Com a desculpa de que nenhum filme se paga sozinho, criou-se em Portugal uma cultura de desprezo pelo espectador. Os espectadores respondem na mesma moeda e ignoram os filmes portugueses, à excepção daqueles em que a narrativa se confunde com as mamas da Soraia Chaves (infelizmente sem direito aos longos planos de Manoel de Oliveira). Qualquer realizador aprende rapidamente que o cinema português só existe com a ajuda do Estado. É uma lição incompleta. O cinema, seja português, chinês ou do planeta do Edgar Pêra, só existe com espectadores. Desprezá-los é contribuir para fazer do cinema a mais dispendiosa variante da masturbação: um prazer solitário que não é visto por ninguém.

Uma aventura nas Laranjeiras.

Tiago Moreira Ramalho, 31.03.10

O povo ofende-se, e sem razão, quando o restante povo, que no caso sou eu, se queixa, ainda para mais publicamente, da falta de trabalho no geral e, também, porque não somos esquisitos, no particular. Vem mais este espectacular post a propósito das quatro, repitamos, quatro, com entoação de coro de Igreja, quatro tardes que eu, que existo em carne e osso, perdi em Lojas do Cidadão da nossa adorada Lisboa. Sexta-feira, um, o sistema arrebentou e uma senhora francamente mal-educada, de vida mal resolvida olhava com desdém para todo o qualquer cidadão que entrasse na Loja, que nome tão horrível, especialmente para aqueles que por acasos do destino tinham a sorte ou o azar de, enfim, ter a pele um pedacinho mais escura. Puta. Segunda-feira, dois, voltei. A afluência, diziam, era grande e nem senha me deram. Nem senha, nem desculpas, nem nada: adeus ó vai-te embora, que nós aqui marimbamo-nos para o tempo que perdes nas viagens. Terça-feira, três, mais uma tarde, tarde inteira, mas consigo ser atendido. Não me dão tudo. Que eram precisas autorizações e mais não sei o quê. Obrigado, boa tarde. Quarta-feira, quatro, repitamos, etc., consigo tratar de tudo e descubro que o pouco que tratei na terça-feira, três, estava mal tratado. Ainda assim, convém notar que, enquanto estes ossos e esta carne, que eu tenho, que eu tenho, esperavam, deram-se ao luxo da tristeza de constatar que havia seis mesinhas de atendimento, mas os empregados tinham o desplante de ter apenas uma senhora a atender, enquanto todos se divertiam com graças, tricas sobre as férias, cafés na mão, ai que gargalhada, ai que otários aqueles ali a olhar para nós, como se tivessem vida, família, trabalho, livros para ler e filmes para ver, até me dói a barriga. Estive quase, mas quase, para fotografar, filmar, qualquer coisa, mas depois lembrei-me que havia leis e assim. Qualquer dia vou ver os senhores da Loja do Cidadão na rua por qualquer motivo, a gritar e assim. Nessa altura, dobro um braço, bato com a mão no bícepe e, para finalizar, levanto o dedinho do meio, à zé povinho.

Entretanto, porque sou uma pessoa atenta às artes e às culturas, reparei que a nossa ministra que mais coisas publica publicou uma coisa nova. Chama-se «Uma Aventura no Pulo do Lobo». Sempre me pareceu que a dona Alçada, minto, mas não faz mal, sempre me pareceu, mentia eu, que a dona Alçada era cavaquista ferrenha. Aliás, ainda não saltou para a blogosfera porque a Caminho, que mudou de gerência, já não de compraz com os direitos do proletariado e, e bem, manda-a trabalhar. Sim, trabalhar, que escrever é outra coisa.

A eterna tecla

Tiago Moreira Ramalho, 30.03.10

Ontem houve Prós e Contras sobre Educação. Há muitos, muitos meses que não vejo o programa, mas ontem, pelo tema, obriguei-me a aturar a figura da moderadora, a quem só falta cuspir para o chão. Pelo tema e pelos participantes, que foram especialmente interessantes, principalmente a Helena Matos e o Nuno Crato. Pelo meio, quando se discutia a margem de manobra das escolas para definirem currícula, um dos participantes da mesa, António Gouveia, voltou a bater na tecla, a eterna tecla, de que os programas têm de ser impostos pelo Ministério. Esta ideia é completamente disparatada e tem sido parte responsável pelo estado da Educação. Se fizermos um esforço e olharmos à volta - às vezes custa - batemos com os narizes nas Universidades onde são os próprios professores e Conselhos Científicos que definem os programas, partindo de uma base que é em certa medida consensual. Até agora, parece-me, não deu mau resultado e a «experimentação» de diferentes técnicas tem, até, ajudado a aperfeiçoar métodos. Não se entende, no entanto, porque é que não se cria algo semelhante nas Escolas Secundárias.

Sejamos objectivos: os Ministérios da Educação não têm sido particularmente felizes na criação de programas. Os programas são, em geral, maus e, pior, instáveis. Sim, porque pior que um mau programa é uma sucessão de maus programas que impede um bom professor de «dar a volta». A troca de cadeiras à conta das «confianças políticas» tem feito com que áreas nucleares como a matemática, por exemplo, tenham tido alterações aos programas que afectam os melhores professores - que dizer dos piores. Além disto, a linha seguida neste momento tem levado a que meia dúzia de autores de livros escolares, muitas vezes autores, em simultâneo, dos próprios programas, detenham o quase monopólio das escolhas das escolas, apesar dos erros e da mediocridade dos textos (ninguém me consegue explicar porque é que, por exemplo, um estudante de História de Portugal do Ensino Básico compra livros escolares de péssima qualidade em vez de enciclopédias de História com muito mais rigor científico e substancialmente mais baratas).

Parece-me evidente que deveria dar-se espaço às escolas para influenciarem os currícula e para terem uma oferta diferenciada. Poder-se-ia manter um tronco comum, imposto pelo ministério, mas flexível. Esta é a única forma de (i) meter professores, verdadeiros professores, a criar programas que sejam para alunos e não para case studies universitários e de (ii) melhorar os métodos de aprendizagem sem condenar gerações inteiras por causa da «padronização» nacional.

Obrigadinhos.

Tiago Moreira Ramalho, 30.03.10

A Douta Ignorância recebeu simpáticas boas-vindas de alguma da melhor blogosfera portuguesa. Compete-nos, agora, agradecer. Ora, portanto, obrigadinhos ao Pedro Rolo Duarte, ao Francisco José Viegas, ao Alexandre Homem Cristo, ao Filipe Nunes Vicente, ao Pedro Correia, ao Luís Naves, ao Luís M. Jorge, ao Tiago Mota Saraiva, ao Samuel de Paiva Pires, à Carla Hilário Quevedo (a única senhora com visível bom gosto), ao João Távora e ao André Azevedo Alves. Obrigadinhos também aos do Sapo, que nos destacaram no Radar e nos ajudaram a montar a casa. Estas foram as referências de que demos conta, ou através do twingly ou das visitas, pelo que não pedimos desculpa caso nos tenha escapado alguém, dado que a culpa, obviamente não é nossa.

O comunismo é o diabo [3]

Tiago Moreira Ramalho, 30.03.10

O Rui e, já agora, o Miguel Madeira têm razão: o meu post «O comunismo é o diabo» é disparatado. Quero dizer, a proposição que compõe o título até que está jeitosinha, mas o argumento, que na realidade não existe, não é grande coisa - lindo paradoxo, acabei de caracterizar uma coisa que não existe, já pareço o Santo Anselmo. Também é isto, isto dos blogues: não temos sempre razão. Que prossiga a emissão, então, ão ão.

O comunismo é o diabo [2]

Rui Passos Rocha, 30.03.10

De acordo com o Tiago:

  • Algumas greves podem prejudicar o bem-estar colectivo.
  • Os comunistas promovem o bem-estar colectivo acima do individual ou corporativo.
  • Logo, os comunistas devem apenas fazer greves que não prejudiquem o bem-estar colectivo.

Será? Mesmo supondo que a greve dos enfermeiros prejudica o bem-estar colectivo (onde se inclui, como contrapeso, o bem-estar dos enfermeiros) e que os sindicalistas em causa são todos comunistas - ou até, se quiserem, membros do PCP -, o silogismo esquece que o comunismo é uma ideologia contrária ao sistema democrático liberal ou constitucional. Um indivíduo que defende valores anti-sistémicos colectivos pode promover atitudes ou comportamentos individualistas ou corporativos num sistema que rejeita - se considerar que essas suas posições favorecem a implementação da sua ideologia. Discutir o comunismo à luz dos preceitos liberais é um buraco negro.

Representem-nos melhor, mas não nos chateiem muito [2]

Rui Passos Rocha, 30.03.10

Os dados são de 1985, período conturbado, mas suponho que actualmente não fugiriam muito a isto. Se a suposição for acertada, então cerca de 80% dos portugueses preferem um tipo de democracia em que - havendo, claro, eleições periódicas - aos governantes seja dado o poder de decidir sem consultar o povo. Por outro lado, como ali escrevi, quer-se que os políticos ajam de acordo com as preferências dos votantes. Procuramos, em duas tretas, candidatos professorais, com convicções firmes, punho de ferro e abnegados. Quem põe este anúncio num jornal?

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