A maçã e o pecado original
Há tempos, depois de ter lido o Rui Tavares congratular-se por ter comprado um iPad, escrevi que me parecia contraditório ele ser defensor de um produto que, se aplicadas aos Estados Unidos - e à China - as regras laborais defendidas pelo BE, dificilmente teria sido concebido. À data o Miguel Madeira deu-me conta de que a opinião do RT não é incoerente se ele acreditar que tais políticas não limitariam a criatividade e o plano de negócios da Apple (1). Ele pode até estar errado, mas não é incoerente (2).
Concordo. Ainda assim, leituras mais recentes fazem-me pensar que os computadores e tablets da Apple são um bom teste ao punho socialista. Se, por um lado, são tidos como superiores à concorrência em muito do que é essencial (velocidade e falhas do sistema, sobretudo), por outro lado o tratamento dos trabalhadores que os fabricam é deplorável.
Como um socialista tende a assentar muito da sua análise da justiça laboral nos direitos dos trabalhadores, a Apple parece-me o tipo de empresa que um socialista junte à sua lista mental de empresas a boicotar - independentemente da qualidade do que essa empresa produz (na verdade muita da concorrência também recorre aos serviços da FoxConn, por isso a escolha não é fácil). Esse não parece ser o caso do RT.
Aqui ficam algumas das condições do trabalho na FoxConn (a empresa que produz os iPads e a restante catrefada de iCoisas):
- A semana de trabalho típica é de 72 horas (5);
- Um trabalhador morreu após 34 seguidas de trabalho (4);
- Não é permitido falar (3);
- Não é permitido olhar em volta (3);
- É proibido usar telemóveis dentro da empresa (4);
- Depois de 12 trabalhadores se terem atirado de janelas para a morte, a solução encontrada pela empresa foi colocar redes à volta do edifício para amparar futuras quedas (3);
- Agora os trabalhadores têm de assinar uma declaração em como não tentarão suicidar-se e, caso o façam mesmo assim, as famílias não receberão qualquer indemnização (5).