Entrevistas no Limite - José Eduardo Agualusa
José Eduardo Agualusa é o nosso primeiro entrevistado fora da blogosfera. É um dos mais importantes romancistas africanos, embora a sua obra possa ser considerada como um produto genuinamente atlântico. O regime angolano não beneficia da indulgência de Agualusa, ao contrário do A Douta Ignorância, um blog que não tem petróleo, que não silencia as vozes críticas (a não ser a de comentadores chatinhos) e que não entrega a gestão dos posts a familiares.
Os seus romances são transatlânticos, miscigenados, do manejo da língua à localização da acção. A lusofonia é identidade ou marketing?
Nem sei ao certo o que é a lusofonia, parece-me um daqueles conceitos elásticos, que cada qual entende à sua maneira. Os meus romances são, como é natural, um resultado do meu próprio percurso. Esse percurso foi, tem sido, escolha e acidente.
Disse, a propósito do Acordo Ortográfico, que Portugal tem um «enraizado sentimento imperial». O que o leva a pensar tal coisa?
O alarido que o referido acordo provocou em Portugal. Participei em inúmeros debates sobre o mesmo e recordo-me perfeitamente de um deles, na casa Fernando Pessoa, durante o qual um imbecil na plateia começou a gritar "a língua é nossa!". É a isto que chamo sentimento imperial.
Numa entrevista à Ler, falava com alguma condescendência sobre Mia Couto, felicitando-o por se libertar das doenças infantis do trocadilho e do neologismo. Há aí uma rivalidade latente?
Pelo amor de Deus, o Mia é tudo o que eu gostaria de ser se tivesse nascido em Moçambique. É o meu melhor amigo. Ele tem arriscado novas formas de maneira extremamente corajosa. O Mia é um caso raro de sucesso de público e de crítica a nível internacional. Podia deitar-se a dormir, mas prefere arriscar e tentar novas formas.
A fotogenia é fundamental para o sucesso literário?
O contrário. O sucesso, literário ou qualquer outro, é importante para o reconhecimento da fotogenia.
Num inquérito da revista New Yorker a 20 vozes com menos de 40 anos, o único escritor lusófono citado como influência é o José Eduardo Agualusa. O reconhecimento dos pares é o mais importante?
Claro, embora dependa dos pares.
Angola é uma democracia embrionária ou uma ditadura moribunda?
Tenho a sensação que é um país que caminha a passos firmes para uma ditadura sólida, para o que conta com o apoio de Portugal, e de muitas outras democracias ocidentais.
Viver a maior parte do tempo em Portugal não o desautoriza enquanto voz crítica do regime? É mais fácil criticar quando se está longe?
O que caracteriza os regimes totalitários é precisamente isso - é mais fácil critica-los quando se está longe. Não pretendo ser uma autoridade, apenas um cidadão preocupado com os destinos do seu país, e prefiro estar preocupado, mas livre, numa situação em que consiga expressar essas minhas preocupações, e ser escutado dentro e fora do país.